Cacos

Das incontornáveis falhas – Malemare e Viridários

A materialidade móvel, cortante, divisível, mineral e a obscuridade histórica do caco dá o tom de uma arqueologia precária.

Caco é o semideus grego citado por Virgílio na Eneida, meio homem, meio touro, vivia numa caverna com seus cacarecos e à noite roubava, até que foi morto por Hércules. De Caco são as cerâmicas, as panelas, o fogo, o escurecer, o erro. Do latim vulgar caccabu: algo de pouco valor, diacrônico, obsoleto, desgastado, ou algo para dar consistência à argamassa. Caco é o meio do caminho entre deuses e humanos, humanos e animais, o inteiro e o em pedaços.

Viridário
Viridário. Jardim de delícias nonsense, Fotografia digital, 2016.
Viridário. Jardim de delícias nonsense, Desenho digital, 2016.

Dentre as pedras do quintal brotam ramalhetes, jardins e aves exóticas interrompidas, pedaços de corpos dançantes e caminhantes, outros animais, um tocante olho de gato e padrões geométricos que decoram a porcelana branca. Irrompem faianças e tantas misturas cerâmicas em tons térreos pastéis variantes, impregnados da poeira ferrugem que até então as sepultava.

Malemare

Uma exposição de cacos cerâmicos em praça pública, Conjunto Cultural da República, Brasília, 2015.

“À menor brisa o lago se cobre de olhos. Quem, de fato, conseguiria lembrar-se de todas as flutuações dos movimentos das ondas?” Quem um dia comeu naquele prato? Tocou seus lábios na borda dourada da xícara? Segurou as asas ainda presas da louça?